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Durante os últimos anos tem-se estudado largamente as interações do sistema imune com o sistema nervoso. Logo, estão surgindo novas descrições de interações e relações entre os dois sistemas, como se vê em um artigo publicado na Nature Medicine em julho, no qual Ben-Shaanan e colaboradores estabeleceram uma relação causal entre a ativação do sistema de recompensa e o aumento da resposta imune (1).

A partir de evidências anteriores de que expectativas e emoções positivas contribuem para os benefícios clínicos observados no efeito placebo, e que esses efeitos são mediados pela ativação do sistema de recompensa cerebral ou “área do prazer”, os autores demonstraram que, quando ativada, a área tegmental ventral (VTA), componente principal do sistema de recompensa, é capaz de melhorar a resposta imune inata e adaptativa. No artigo, os autores demonstram, ainda, que esse fenômeno pode ser, ao menos em parte, mediado pelo sistema nervoso simpático (SNS), o qual, conforme largamente demonstrado na literatura, inerva os órgãos linfoides periféricos (2).
No estudo, com o intuito de manipular a atividade de grupos de neurônios específicos, os autores utilizaram um receptor acoplado à proteína G (GPCR) mutante que pode ser ativado por um ligante inerte, empregando para a tal uma tecnologia chamada DREADD (Designer Receptors Exclusively Activated by Designer Drugs). Assim, camundongos transgênicos que expressam a recombinase Cre sob o controle do promotor da tirosina hidroxilase (principal enzima da via de síntese de catecolaminas) – ditos camundongos TH-Cre – foram injetados por meio de cirurgia estereotáxica com vetor viral expressando o GPCR e uma molécula de fluorescência (mCherry) de modo dependente de Cre, ou seja, apenas os neurônios dopaminérgicos da VTA, os quais expressam TH e portanto Cre, passam a expressar também o GPCR e o marcador fluorescente. Nesse sistema, os neurônios da VTA que expressam o receptor são diretamente ativados pela injeção de clozapina-N-oxido (CNO), aumentando assim a atividade da VTA.
Inicialmente, os autores verificaram que o simples aumento de atividade da VTA per se foi capaz de causar alterações nas células do sistema imune presentes no baço e sangue desses animais, como por exemplo, aumento da expressão dos receptores TLR4, CD25 e moléculas coestimuladoras (CD80 e CD86) em linfócitos B, monócitos e macrófagos. Posteriormente, os animais foram infectados com E. coli (24h após a ativação da VTA) e a resposta imune inata foi avaliada. Eles observaram que, após ativação da VTA, a fagocitose mediada por células mononucleares CD11b+ foi aumentada in vivo, bem como a atividade fagocítica in vitro de células dendríticas CD11c+ e de macrófagos CD11b+F4/80+ recuperados do animal. Além disso, 4h após a infecção, foi observada menor carga bacteriana no fígado, o que denota atividade microbicida aumentada nos camundongos com ativação da VTA.
Os autores avaliaram também a influência da estimulação da VTA na resposta imune adaptativa e verificaram que, 3 dias após a infecção por E. coli, houve aumento de imunoglobulinas e células produtoras de interferon-γ (mas não de IL-4) no soro e baço, respectivamente, dos camundongos com atividade da VTA aumentada. Resultados similares foram observados quando esplenócitos desses animais foram re-estimulados in vitro, 7 dias após a infecção. O aumento na imunidade adaptativa observado foi também confirmado por meio de um modelo de hipersensibilidade tardia (DTH) que mostrou efeito duradouro da estimulação da VTA sobre a resposta imune.
Por fim, os autores fizeram uso de ablação química das fibras nervosas periféricas do SNS e, deste modo, não mais observaram aumento na ativação das células do sistema imune ou no clearance bacteriano em animais com atividade da VTA aumentada, o que sugere a participação do SNS nesses efeitos mediados pelo sistema de recompensa. No entanto, essa questão ainda é controversa na literatura: trabalhos anteriores mostraram que a ablação química da inervação simpática periférica pode aumentar a resposta imune antibacteriana, sugerindo portanto que o SNS poderia regular negativamente esse tipo de resposta imune (3,4). De fato, já foi demonstrado que a sinalização via o receptor beta2-adrenérgico pode diminuir diversos parâmetros relacionados à resposta inflamatória, tanto em células dendríticas (5) quanto em macrófagos (6).
Aqui, cabe ressaltar que já foi demonstrado que células do sistema imune, sob diferentes estímulos de ativação, são capazes de produzir catecolaminas as quais, por sua vez, podem agir de maneira autócrina ou parácrina modulando a atividade dessas células (7-10). O efeito do tratamento sistêmico com 6-OHDA para ablação química das fibras do SNS sobre as células do sistema imune que também expressam TH e secretam catecolaminas não é claro. No entanto, é bem possível que isto possa ajudar a explicar as controvérsias presentes na literatura quando olhamos estudos investigando o eventual papel do SNS na regulação do sistema imune e que fizeram uso da ablação química das fibras catecolaminérgicas.
Portanto, a influência do sistema nervoso no sistema imune (e vice-versa) é uma questão complexa e que precisa continuar sendo investigada…na dúvida, placebo e postive vibrations, yeah!!!
 
Referências
(1) Bem-Shaanan, T., et al., Activation of the reward system boosts innate and adaptive immunity. Nature Medicine, 2016. 22(8):940-944.
(2) Madden K.S., et al., Catecholamine influences and sympathetic neural modulation of immune responsiveness. Annu Rev Pharmacol Toxicol, 1995. 35:417-448.
(3) Seeley, E. J., et al., Noradrenergic neurons regulate monocyte trafficking and mortality during gram-negative peritonitis in mice. J Immunol, 2013. 190(9):4717-24.
(4) Straub, R. H., et al., Ablation of the sympathetic nervous system decreases gram-negative and increases gram-positive bacterial dissemination: key roles for tumor necrosis factor/phagocytes and interleukin-4/ lymphocytes. J. Infect. Disasses, 2005. 192(4):560-72.
(5) Takenaka, M.C., et al., Norepinephrine controls effector T cell differentiation through β2-adrenergic receptor-mediated inhibition of NF-κB and AP-1 in dendritic cells. Journal of Immunology, 2016. 196(2):637-44.
(6) Gabanyi I., et al., Neuro-immune Interactions Drive Tissue Programming in Intestinal Macrophages. Cell, 2016. 164(3):378-91.
(7) Bergquist J., et al., Discovery of endogenous catecholamines in lymphocytes and evidence for catecholamine regulation of lymphocyte function via an autocrine loop. Proc Natl Acad Sci U S A, 1994. 91(26):12912-12916
(8) Nguyen K.D., et al., Alternatively activated macrophages produce catecholamines to sustain adaptive thermogenesis. Nature, 2011. 480(7375):104-108.
(9) Shaked I., Hanna R.N., et al., Transcription factor Nr4a1 couples sympathetic and inflammatory cues in CNS-recruited macrophages to limit neuroinflammation. Nat. Immunol., 2015. 16(12):1228-34.
(10) Flierl, M. A., et al., Phagocyte-derived catecholamines enhance acute inflammatory injury. Nature, 2007. 449(7163):721-5.

http://sbi.org.br.

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